Em mais este caso, Hercule Poirot vai percorrer um longo caminho até descobrir o responsável pelos crimes cometidos no colégio Meadowbank, só para moças, na Inglaterra: as razões para os assassinatos estão muito mais longe daquele país do que se poderia imaginar.
Um Gato Entre os Pombos – Agatha Christie
Capítulo 6
Primeiros dias
I
Na sala dos professores, as novidades estavam sendo contadas. Viagens para o exterior, peças vistas, exposições de arte visitadas. Fotografias foram passadas de mão em mão. A ameaça dos slides coloridos ainda estava ao largo. Todas as entusiastas queriam mostrar suas próprias fotos, mas escapar de serem forçadas a ver as das outras pessoas.
Logo a conversa tornou-se menos pessoal. O novo pavilhão de esportes foi ao mesmo tempo criticado e admirado. Admitia-se que era um belo prédio, mas é claro que todas queriam melhorar seu projeto de um jeito ou outro.
As novas garotas foram então brevemente passadas em revista, e, no todo, o veredicto foi favorável.
Trocaram-se algumas amenidades com as duas novas integrantes da equipe. Mademoiselle Blanche já estivera na Inglaterra antes? De qual parte da França ela vinha?
Mademoiselle Blanche respondeu de modo educado, mas com reservas.
A srta. Springer foi mais direta.
Ela falou com ênfase e decisão. Poder-se-ia dizer que ela estava dando uma palestra. Assunto: a excelência da srta. Springer. Como ela havia sido apreciada como colega. Como as diretoras das escolas haviam aceitado seus conselhos com gratidão e reorganizado seus cronogramas de acordo.
A srta. Springer não era uma pessoa sensível. A inquietação de seu público passou despercebida por ela. Sobrou para a srta. Johnson perguntar em seu tom moderado:
– Mesmo assim, imagino que suas ideias nem sempre tenham sido aceitas da maneira que elas… hum… deveriam ter sido.
– Deve-se estar preparada para a ingratidão – disse a srta. Springer. Sua voz, já alta, ficou mais alta ainda. – O problema é que as pessoas agem de maneira tão covarde, não enfrentam os fatos. Elas quase sempre preferem não ver o que está debaixo de seus narizes o tempo inteiro. Eu não sou assim. Vou direto ao ponto. Mais de uma vez descobri um grave escândalo e o revelei a todos. Tenho um bom nariz, assim que farejo uma pista, eu não a deixo, não até ter encurralado a minha presa. – Ela deu uma gargalhada alta. – Em minha opinião, ninguém cujos afazeres não sejam um livro aberto deve dar aulas em uma escola. Se alguém tem algo a esconder, você logo percebe. Oh! Vocês ficariam surpresas se eu lhes contasse algumas das coisas que descobri sobre as pessoas. Coisas que ninguém jamais sonhou.
– Você gostou da experiência, não é mesmo? – perguntou mademoiselle Blanche.
– É claro que não. Estava apenas fazendo meu trabalho. Mas não fui apoiada. Uma indulgência vergonhosa. Então pedi demissão em protesto.
Ela olhou em volta e deu sua risada jovial divertida mais uma vez.
– Espero que ninguém aqui tenha algo para esconder – disse ela com alegria.
Ninguém achou engraçado. Mas a srta. Springer não era o tipo de mulher que perceberia isto.
II
– Posso falar-lhe, srta. Bulstrode?
A srta. Bulstrode largou sua caneta e olhou para o rosto ruborizado da governanta, srta. Johnson.
– Sim, srta. Johnson.
– É aquela garota, Shaista, a garota egípcia ou o que quer que ela seja.
– Sim?
– É a sua... hum... roupa de baixo.
As sobrancelhas da srta. Bulstrode ergueram-se com uma surpresa paciente.
– É o seu... bem, corpete.
– O que há de errado com o sutiã dela?
– Bem, não é do tipo comum, quero dizer, ele não a segura exatamente. Ele... hum, bem, a empurra para cima, de maneira bastante desnecessária mesmo.
A srta. Bulstrode mordeu seu lábio para refrear um sorriso, como acontecia tantas vezes ao falar com a srta. Johnson.
– Talvez eu deva dar uma olhada nisto – disse ela com gravidade.
Uma espécie de inquérito foi feito então, com o utensílio infrator sendo exibido pela srta. Johnson, enquanto Shaista observava a cena com vivo interesse.
– É este conjunto e... hum, armação – disse a srta. Johnson com desaprovação.
Shaista irrompeu numa explicação animada.
– A questão é que os meus seios não são muito grandes, nem perto disto. Eu não pareço o suficiente com uma mulher. E é muito importante para uma garota mostrar que ela é uma mulher e não um garoto.
–