Douglas Quail um escriturário casado, sonha em viajar para Marte. Sua esposa entretanto, faz questão de lembrá-lo que essa idéia não passa de um sonho. Há em Chicago um empresa chamada Rekordações S.A. que implanta memórias falsas no cérebro de quem deseja ter a lembrança de algo que nunca teve realmente. Para ele essa é a única maneira de realizar o sonho de ir à Marte, devido principalmente ao alto custo que impede a realização da tal viagem. Então ele resolve ir à essa tal empresa. A memória que Douglas deseja implantar, seria mais perfeita que uma memória real, já que ele não poderia se esquecer de nenhum detalhe da viagem à Marte. Quando submetido aos processos de implantação da memória falsa, descobriram que não possuía espaço para inserí-las. Para surpresa de todos, Quail já havia estado em Marte em uma missão secreta pela Interplan e não se lembrara de nada… mas foi lhe aplicado um soro da verdade, fazendo com que se recorde de toda a missão.
Podemos Recordar para Você, por um Preço Razoável – Philip K. Dick
Podemos Recordar para Você,
por um Preço Razoável
PHILIP K. DICK
Histórias de Philip K. Dick
Tradução: Ricardo Gouveia Coordenação: Heloísa Prieto
Copyright © by The Estate of Philip K. Dick, 1987
Título original: The Litle Black Box - volume 5 of the collected stories of Philip K. Dick
ISBN 85-85391-15-4
1991
Perosa Editores Ltda
Sobre o Autor
Philip K. Dick, morto em 1982, é um dos maiores escritores contemporâneos de ficção científica, tendo recebido em 1983 o prêmio Hugo, o mais importante na área. Sua obra inclui o romance Andróides sonham com ovelhas elétricas?, origem do cultuado filme Blade Runner (O caçador de andróides).
A imortalidade, a frágil fronteira entre o real e o imaginário, mundos cheios de desafios e perigosas aventuras, estes são os elementos que compõe o universo ficcional desse autor extraordinário que, ao falar de sua obra, dizia apenas registrar "vozes" que captava "de uma outra estrela".
Sobre o Tradutor
Ricardo Gouveia é jornalista, tradutor e escritor de romances de ficção científica. Publicou recentemente se livro Um ar condicionado. Possui várias peças infanto-juvenis premiadas e seis obras infantis publicadas.
Podemos Recordar para Você, por um Preço Razoável
ELE ACORDOU — e desejou Marte. Os vales, pensou. Qual seria a sensação de caminhar penosamente por entre eles? Maior, cada vez maior, o sonho crescia à medida que ia ficando plenamente consciente, o sonho e também o desejo. Ele quase podia sentir a presença envolvente do outro mundo, que apenas agentes do governo e altos oficiais já tinham visto. Um empregado como ele? Improvável.
— Você vai levantar ou não? — perguntou sonolenta sua esposa Kirsten, com o mau humor de sempre. — se vai, aperte o botão de café quente nessa porcaria de fogão.
— Certo — disse Douglas Quail, e seguiu descalço do quarto de seu conapt até a cozinha. Lá, depois de obedientemente apertar o botão do café quente, sentou-se à mesa da cozinha e sacou uma latinha amarela de fino rapé Dean Swift. Inalou energicamente, e a mistura Beau Nash aguilhoou-lhe o nariz, queimou-lhe o céu da boca. Mas ele inalou mais uma vez: aquilo o despertava e fazia com que seus sonhos, seus desejos noturnos e eventuais impulsos se condensassem em uma fachada de racionalidade.
Eu irei, disse ele a si mesmo. Antes de morrer eu verei Marte.
Isso era impossível, claro, e ele sabia disso mesmo sonhando. Mas, à luz do dia, os gestos cotidianos de sua esposa — agora escovando os cabelos diante do espelho do quarto — tudo conspirava para lembrar-lhe o que era. Um mísero empregadinho assalariado, ele disse a si mesmo com amargura. Kirsten lembrava-o disso pelo menos uma vez por dia, e ele não a culpava: era dever da esposa trazer o marido de volta à Terra. De volta à Terra, ele pensou, e riu. Aqui, a figura de linguagem era literalmente adequada.
— Do que é que você está rindo? — perguntou a esposa entrando majestosa na cozinha, seu longo robe rosa-buliçoso balançando atrás dela. — Um sonho, aposto. Você está sempre cheio deles.
— Sim — disse ele, e olhou pela janela para os hovercars e rúneis de trânsito, e para todas aquelas pequenas e enérgicas pessoas correndo para o trabalho. Daqui a pouquinho estaria entre elas. Como sempre.
— Aposto que tem a ver com alguma mulher — disse Kirsten, devastadora.
— Não — disse ele. — Foi com um deus. O deus da guerra. Ele em maravilhosas crateras com todo o tipo d vida vegetal crescendo no fundo delas.
— Escute. — Kirsten agachou-se ao lado dele e falou francamente, seu ríspido tom de vez momentaneamente esquecido. — O fundo do oceano, nosso oceano é muito, uma infinidade de vezes, mais bonito. Você sabe disso, todo mundo sabe. Alugue umas roupas de guelras artificiais para nós dois, tire uma semana de licença no trabalho, e poderemos descer viver lá embaixo em uma dessas estâncias aquáticas que funcionam o ano inteiro. E além disso... — Ela interrompeu-se. — Você não está escutando. Deveria estar. Eis aqui algo muito melhor