Numa Fria – Charles Bukowski

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Charles Bukowski nasceu na Alemanha em 1920 e morreu nos Estados Unidos em 1994. Veio para a América com dois anos e tornou-se um dos maiores poetas e ficcionistas dos Estados Unidos. Santo padroeiro dos bêbados escritores, escreveu, entre outros clássicos, Cartas na rua, Mulheres, Crônica de um amor louco, Fabulário geral do delírio cotidiano, Notas de um velho safado, Hollywood (argumento do filme Barfly, direção de Barbet Schroeder, com Mickey Rourke e Faye Dunaway), a novela Pulp e o O capitão saiu para o almoço e os marinheiros tomaram conta do navio, livro confessional e seu último trabalho publicado antes de morrer.

Sua obra poética é vasta e jamais foi traduzida no Brasil. A diferença entre Bukowski e outros malditos é que ele não foi um mártir, nem um anjo caído. Às vezes, quando cai, cai atirando, sem autopiedade. Alguns de seus diálogos são memoráveis, e a violência de sua linguagem geralmente oculta uma indisfarçável ternura pelos perdedores e excluídos. Numa fria é Bukowski puro: uma preciosa coletânea de contos, gênero ao qual ele se dedicou mais intensamente.

para Michael Montfort Menos delicado que os gafanhotos – Bolas – ele disse. – Estou cansado de pintar. Vamos sair. Estou cheio desse fedor de tinta, estou cansado de ser grande. Estou cansado de esperar pela morte. Vamos sair. – Sair pra onde? – ela perguntou. – Pra qualquer lugar. Comer, beber, ver. – Jorg – ela disse –, que é que eu vou fazer quando você morrer? – Vai comer, dormir, foder, mijar, se vestir, andar por aí e encher o saco dos outros. – Eu preciso de segurança. – Todos nós. – Quer dizer, não somos casados. Eu não vou poder nem receber o seu seguro. – Tá tudo bem, não esquenta com isso. Além do mais, você não acredita em casamento, Arlene. Arlene sentava-se na poltrona cor-de-rosa lendo o jornal da tarde. – Você diz que cinco mil mulheres querem dormir com você. Onde é que eu fico? – Cinco mil e uma. – Acha que eu não consigo outro homem? – Não, pra você não tem problema. Pode arranjar outro homem em três minutos. – Acha que eu preciso de um grande pintor? – Não precisa, não. Um bom bombeiro serve. – É, desde que ele me ame. – Claro. Ponha o casaco. Vamos sair. Desceram a escada do sótão. Para todos os lados, quartos baratos, entupidos de baratas, mas ninguém parecia passar fome: pareciam viver cozinhando coisas em panelões e sentados por toda parte, fumando, limpando as unhas, bebendo latas de cerveja ou dividindo uma comprida garrafa azul de vinho branco, gritando ou rindo uns com os outros, ou peidando, arrotando ou dormindo diante da TV. Não havia muita gente com dinheiro no mundo, mas quanto menos dinheiro tinham melhor pareciam viver. Só precisavam de sono, lençóis limpos, comida, bebida e pomada para hemorroidas. E sempre deixavam os quartos um pouco abertos. – Idiotas – disse Jorg, quando desciam a escada –, passam a vida fofocando e enchendo a minha vida. – Oh, Jorg – suspirou Arlene. – Você simplesmente não gosta das pessoas, gosta? Jorg ergueu uma sobrancelha para ela, mas não respondeu. A reação de Arlene ao que ele sentia pelas massas era sempre a mesma – como se não amar as pessoas fosse algo que revelasse uma imperdoável deficiência espiritual. Mas ela era uma foda excelente e uma companhia agradável – a maior parte do tempo. Chegaram ao boulevard e seguiram andando, Jorg com a barba vermelha e branca, os dentes amarelos podres e o mau hálito, as orelhas roxas, os olhos assustados, o casaco fedorento rasgado e a bengala branca de marfim. Sentia-se melhor quando estava pior. – Merda – disse –, tudo morre cagando. Arlene rebolava o rabo, não fazendo segredo dele, Jorg batia na calçada com a bengala, e até o sol olhava lá de cima e dizia Ô-hô! Chegaram finalmente ao velho prédio miserável onde morava Serge. Jorg e Serge vinham ambos pintando há anos, mas só recentemente tinham vendido suas obras por mais que peidos de porco. Tinham passado fome juntos, agora se tornavam famosos separados. Jorg e Arlene entraram no hotel e subiram a escada. O cheiro de iodo e fritura de frango enchia os corredores. Num quarto, alguém fodia sem fazer segredo disso. Eles subiram até o sótão e Arlene bateu. Abriu-se a porta, e lá estava Serge. – Tchan-tchan! – ele disse. E corou. – Oh, desculpem... entrem. – Que diabos deu em você? – perguntou Jorg. – Senta aí. Pensei que fosse Lila... – Você brinca de esconder com Lila? – Esquece. – Serge, você precisa se livrar dessa dona, ela está fundindo sua cuca. – Ela aponta meus lápis. – Serge, ela é jovem demais pra você. – Tem trinta anos. – E você sessenta. São trinta anos. – Trinta anos é demais? – Claro. – E vinte? – perguntou Serge, olhando para Arlene. – Vinte anos é aceitável. Trinta anos é obsceno. – Por que vocês dois não arranjam mulheres da sua idade? – perguntou Arlene. Os dois olharam-na. – Ela gosta de fazer piadinhas – disse Jorg. – É – disse Jorg –, é engraçada. Vamos lá, escuta, eu mostro a vocês o que estou fazendo. Seguiram-no até o quarto. Ele tirou os sapatos e estendeu-se na cama. – Estão vendo? É assim, olha. Todos os confortos.
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