Quanto ouro foi levado para fora do Brasil? Como foram as excursões que desbravaram o coração do país na busca pelo eldorado brasileiro? Nesta reportagem histórica, narrada como um romance de aventura, o jornalista Lucas Figueiredo conta como a cobiça forjou um país, sustentou Portugal e inflamou o mundo.
Boa Ventura! – Lucas Figueiredo
Capítulo 7:
Os escondidos de Deus
O Brasil se tornara um celeiro de boas-novas. Depois da Casa da Casca, de Itaverava e do Tripuí, o metal precioso apareceu no ribeirão do Carmo, rio Gualacho, rio das Mortes, rio das Velhas, em Catas Altas, Santa Bárbara, Ivituruí... “Para todos os lados e por todos aqueles matos se acha ouro, com maior ou menor rendimento”, informou ao rei uma autoridade da Coroa.1 O metal precioso era encontrado nas margens e nos leitos dos rios, nas encostas dos morros e até à flor da terra.2 Era cutucar o chão, batear ou cavoucar o cascalho e o ouro “faiscava” — amarelo, avermelhado, claro como a prata ou escuro e sem brilho.3 O ouro surgia em formatos variados: em pó, grãos, folhetas e pepitas, algumas arredondadas e grandes como batatas.4 Às vezes, acontecia de numa só bateada surgirem quase 200 gramas de ouro na gamela.5 Pepitas enormes também foram encontradas. Três sócios que mineravam na mesma lavra dividiram com um machado uma pedra de 1,3 quilo de ouro.6 Outro achado, ainda maior, pesava 2,7 quilos.7
Já em 1697, el-rei pôde sentir em suas mãos o metal precioso do Brasil. Em setembro daquele ano, doze navios vindos do Rio de Janeiro aportaram em Lisboa. Além do tradicional açúcar, traziam “uma partida de ouro em barra”.8 A presença do metal na frota vinda do Brasil era coisa tão inusitada que espiões franceses baseados em Lisboa pensaram que o ouro era proveniente do Peru.9 Mas logo todos saberiam da novidade e o mundo voltaria seus olhos para o Brasil.
Os primeiros paulistas que conseguiram se instalar em Minas Gerais tiveram uma dupla felicidade. Além de contarem com uma quantidade extraordinária de ouro de fácil extração, eles não precisavam se preocupar com a concorrência. Os que chegavam e encontravam um ou dois ribeirões ocupados caminhavam um pouco mais até achar um pedaço de terra virgem, onde saciavam suas ambições. Afora os achados excepcionais, cada homem tirava a impressionante média de 200 gramas de ouro por ano.10 Assim, um paulista com cem escravos podia apurar anualmente 20 quilos de ouro. Acostumados na pobreza, para os paulistas o negócio era esplêndido. Já para a Coroa, era motivo de preocupação.
Lisboa temia que o tesouro recém-descoberto chamasse a atenção dos estrangeiros. O ideal para a Coroa era que a existência das minas fosse de conhecimento apenas dos eremíticos paulistas e continuasse sendo ignorada pelo restante da colônia e do mundo. Dessa forma, Lisboa poderia planejar e estruturar melhor a mineração, obtendo assim maiores lucros. Na tentativa de manter o segredo, o reino se esforçou ao máximo para impedir a circulação de relatos e de mapas que contivessem informações sobre a qualidade e a localização das minas do Brasil.11 Essa luta, contudo, nasceu perdida. Como a mineração precisava de muitos braços, quem encontrava um terreno de boa pinta tratava logo de mandar mensagens a parentes e amigos pedindo reforços.12 À medida que o contingente de mineradores aumentava, aumentava também o número de relatos. Assim, de boca em boca, sem que a Coroa pudesse fazer nada a respeito, a notícia da descoberta do Eldorado português saiu do sertão, passou por São Paulo, alcançou a Bahia e o Rio de Janeiro e seguiu para a Europa. Um relato de 1733 dá conta do que aconteceu:
A exuberante cópia de ouro destas minas deu logo estrondoso brado, cujos ecos soaram nos mais distantes e recônditos seios da América (...). Os mesmos ecos, levados nas asas da fama sobre os mares, voaram à Europa. Foram ouvidos em Portugal com atenções de estranha novidade e alvoroços de alegria. Nos reinos estrangeiros, com esperança de utilidade e maior inveja da fortuna.13
A inveja estrangeira de fato existia e não era pequena. A França, por exemplo, tinha um espião na colônia que abastecia Paris com notícias frescas sobre as minas.14 Entre os primeiros funcionários da Coroa Portuguesa que pisaram na região do ouro, também havia quem falasse e escrevesse demais, gerando assim inf