Entender as razões da aparentemente complicada Língua Portuguesa, aprender os seus princípios funcionais e descobrir prazerosamente as suas maravilhas: é o que o conceituado professor Cláudio Moreno pretende partilhar com leitores e alunos neste Guia prático do Português correto – para gostar de aprender. Com uma linguagem totalmente acessível e não-acadêmica, utilizando um tom coloquial bem-humorado, ágil e compreensível a todos, Moreno aborda as principais questões do nosso idioma. Este livro não dita leis rígidas, mas parte de uma ampla e moderna visão da língua, segundo a qual o uso é que define as regras, não o contrário. Moreno substitui as usuais e frias regras gramaticais pela simples explicação e compreensão dos fenômenos do Português, sempre aguçando a curiosidade dos leitores. O principal assunto deste livro é a Ortografia: são tratadas dúvidas a respeito do emprego das letras e do hífen, de acentuação e sinais e de pronúncia.
Com Guia prático do Português correto – para gostar de aprender, o Português recupera sua devida dignidade, enquanto o leitor aprende e se diverte
3. Como se escreve: hífen e assemelhados
Que ninguém espere coerência no uso do hífen; não há exagero algum quando Mattoso Câmara Jr. afirma que “o emprego deste sinal gráfico é incoerente e confuso”. Os ortógrafos divergem entre si e do que ficou estabelecido no atual VOLP. Não existe, nem poderá existir um critério unitário quanto ao seu emprego, porque as palavras em que este sinal mais aparece – os substantivos e os adjetivos compostos – constituem uma área extremamente movediça, simplesmente porque não sabemos ao certo se estamos diante de um verdadeiro vocábulo ou de uma simples locução (um sintagma). Por que o Aurélio registra pedra filosofal, pedra lascada, pedra de toque, mas pedra-ímã, pedra-sabão e pedra-mármore? Por que pára-sol, vai-volta, passa-pé e sangue-frio, mas girassol, vaivém, pontapé e sanguessuga? Escreve-se anteontem e antes de ontem, ponto e vírgula e ponto-e-vírgula – e, seja junto ou separado, sempre haverá justificativas para uma ou a outra forma.
A única regulamentação mais ou menos organizada do hífen refere-se aos vocábulos formados com prefixos, que, por existirem em número limitado, permitem (ao contrário dos compostos comuns) uma razoável padronização. Há, por exemplo, prefixos que sempre serão seguidos de hífen: ex- (“o que não é mais”), vice- e todos os prefixos que receberem acento gráfico (pré-, pós-, etc.): ex-marido, vice-prefeito, pré-fabricado, pós-operatório. Assim dispunha a Reforma de 1943, assim dispõe o atual Acordo.
Mudanças no hífen com prefixos
Das novas regras introduzidas pela atual Reforma, três vieram realmente aperfeiçoar nossa ortografia e facilitar o trabalho do usuário (se o Acordo apenas acrescentasse estas três regras ao sistema 1943-1971, teríamos chegado muito perto da perfeição):
1. Usaremos hífen sempre que o prefixo terminar por vogal idêntica à que inicia o segundo elemento: anti-inflamatório, micro-onda, micro-organismo, neo-ortodoxo. Se as vogais forem diferentes, contudo, não há hífen: antiestático, microindústria, neoexpressionismo, infraestrutura, autoestrada. Esta regra é um grande progresso em comparação com o sistema anterior, porque não exige memorização alguma por parte do usuário. Encontraram-se duas vogais idênticas? Hífen.
2. Usaremos hífen sempre que o segundo elemento começar por H: geo-história, mini-hospital, sub-habitação, co-herdeiro. Outra regra elogiável, pois evita que a palavra original fique desfigurada com a perda do H inicial.
3. Não há hífen quando o prefixo terminar em vogal e o segundo elemento iniciar por R ou S, o que nos obriga a duplicar o R ou o S: contrarregra, autosserviço, contrassenha, neorrealismo, ultrassom, antissemita.
Há outras regrinhas menores (e menos felizes) sobre o emprego do hífen, mas elas – bem como as que mencionei acima – serão examinadas adiante, nas respostas aos leitores.
sócio-econômico
Aspectos sociais e econômicos são aspectos sócio-econômicos ou socioeconômicos? Cirurgia buco-maxilo-facial ou bucomaxilofacial? Segundo o Aurélio e o Houaiss, deveríamos empregar a forma sem hífen; contudo, como vamos ver, a coisa não é tão simples assim.
Um doutor em Odontologia relata que, ao defender sua tese, foi questionado pela banca sobre a grafia de buco-maxilo-facial, que é escrita sem hífen na PUCRS, mas com hífen na UFES, sua universidade de origem. Essa divergência entre a forma de grafar este vocábulo nas duas universidades não me espanta. Temos aqui mais um daqueles casos em que dois entendimentos diferentes podem ser extraídos de uma mesma regra – e que ninguém, por causa disso, comece a esbravejar contra o Português. Este é um problema intrínseco a qualquer regra; mais da metade do esforço intelectual de quem trabalha com o Direito, por exemplo, é dispendido para verificar quais os fatos concretos que se enquadram numa determinada norma.
Quando se forma um adjetivo composto de dois outros adjetivos (adjetivo + adjetivo), nosso sistema ortográfico determina que se use o hífen quando o primei